A Rainha do Punk Rock, a Rainha do Shock Rock, a Alta Sacerdotisa do Metal. Tantos termos para tentar definir quem foi Wendy O. Williams, talvez deem alguma ideia da dimensão que foi a performance dessa artista que se estivesse viva hoje completaria 70 anos. "Eu amo música pesada e rápida. Eu não sou uma pessoa de fórmula, não faço músicas de fórmula. Sou viciada em adrenalina, um das poucos respiros de sanidade para mim nesse mundo insano".
A forma como se expunha nos palcos escondia uma pessoa tímida e reservada nos bastidores, a cantora não gostava de comentar sobre sua vida pré-Plasmatics, muito porque não tinha boas lembranças de sua infância solitária. Algumas coisas que se sabe era que nasceu na cidade de Rochester, em Nova Iorque, e seu nome era Wendy Orlean Williams. Seu pai era um químico que teve três filhas e desejava que todas tivessem empregos formais, o que contrariou suas expectativas. Em diversas entrevistas, quando perguntavam o porquê de ser assim, Wendy respondia sem hesitar: "Eu simplesmente não me encaixei, não deu certo, tive que quebrar algumas regras".
Aos 15 anos largou tudo, abandonou a escola, pintou o cabelo de loiro, perdeu a virgindade e foi seguir uma vida de hippie na estrada até o oeste americano (chegou a vender colares de miçangas e biquínis de macramê feitos à mão). Depois mudou-se para Europa, rodou por alguns países tendo diversos sub-empregos e voltou à Nova Iorque em 1976, onde descobriu um emprego através de um anúncio no jornal para o Captain Kink's Sex Fantasy Theater. Ela se interessou tanto em participar que foi se encontrar pessoalmente com o criador do show, Rod Swenson, um graduado em Yale com Mestrado em Belas Artes. Além do teatro, Rod tinha outra ideia: queria formar uma banda de rock incomum, desagradável e Wendy se empolgou tanto que queria ser parte disso. Os dois se juntaram ao projeto e também começaram um relacionamento.
The Plasmatics era uma banda que teve seu conceito idealizado e criado por Rod Swenson. Ele era empresário, compunha as letras, tirava as fotos, fazia de tudo, mas o grupo não teria a proporção que teve sem a grande presença carismática de Wendy, tanto que no início Rod pensava em colocar três cantoras, mas ninguém conseguiu acompanhar o ritmo, as outras sumiam diante dela. Em julho de 1978 houve a estreia com Wendy nos vocais, o guitarrista Richie Stotts e o baixista Chosei Funahara e mais alguém que chamaram para assumir a bateria. A repercussão no cenário underground foi imediata, logo a banda seria a que mais lotava shows no CBGB.
Foi só no final de 1980 que o Plasmatics seria conhecido do grande público quando Wendy pulou fora de um Cadillac em movimento que logo explodiu e voou fora do pier 62 em direção ao Rio Hudson. Esse seria um dos momentos emblemáticos e que marcaria a memória das pessoas sobre as apresentações da banda. As performances incríveis de Wendy continham a clássica marretada e destruição de tevês, rádios, carros e guitarras, essa última ela também cortava com uma motosserra ao meio e jogava os pedaços na plateia. O Cadillac era o modelo favorito para explodir e pichar nos palcos. Esses objetos eram alvos preferidos pois simbolizavam a cultura de consumo norte-americana da época, mas não foram os únicos alvos. "Parte do que fazíamos era uma massa de destruição de ícones consumistas, então a gente dava marretada em televisões e os carros escolhíamos os Cadillacs porque eles eram o 'sonho americano'", revelou Rod.
Video clip: The Damned
Wendy era uma rockstar que ia na contramão do que o rock mainstream apresentava nas décadas de 1970 e 80. Enquanto muitos exibiam suas riquezas por meio de suas mansões, carros e até aviões, Wendy era critica ferrenha ao consumismo. Não é que ela fosse contra as pessoas comprarem, o ponto que questionava era os produtos que a sociedade consumia, na maioria das vezes de forma alienada, sem saber os problemas que causavam ao meio ambiente e consequentemente a sua própria saúde, pois há venenos que empurram para a população consumir sem saber a verdade, principalmente em alimentos.
Força física que aguentava nos ombros o guitarrista. |
Era comum em entrevistas elogiarem a forma física de Wendy, que iniciou no Plasmatics aos 28 anos de idade. Ela respondia que cuidava sim muito do seu corpo e que por isso tentava ser a mais saudável possível se exercitando e sendo vegetariana desde a adolescência. O fumo e a droga que hora fizeram parte de sua vida, não estavam mais presentes, era proibido até Coca-Cola. Pois é, Wendy fazia todas aquelas loucuras no palco completamente sóbria!
Esteticamente Wendy foi precursora de muitas modas. Quando começou na banda, tinha um cabelo loiro platinado com mechas rosas, pode-se conferir o visual no primeiro álbum 'New Hope for the Wretched'. Dizem que foi depois de Setembro de 1980 que Wendy cortaria seu famoso cabelo moicano, uma de suas maiores marcas registradas. Seria uma das primeiras mulheres a usar o corte, ficando a dúvida se seria antes até de Wattie Buchan, vocalista do The Exploited. Chegou a ter o moicano em duas cores, preto e loiro durante 1981 e 1984. No final do último ano voltaria ao cabelo comprido loiro e com franja, visto na capa de seu álbum solo W.O.W. Ficaria assim até o final da banda e nas raras aparições após o término, os fios estavam cacheados.
O guitarrista Richie Stotts costumava usar saias, inclusive tutu, bem ao estilo punk bailarina.
Já na parte das roupas havia uma questão interessante: Wendy era supersexy, suas peças eram sempre justíssimas, minúsculas, isso quando não estava só de calcinha fio dental e sutiã ou coberta de espuma de barbear. Mas ela tinha uma atitude tão forte no palco, uma presença tão agressiva, que essa sexualidade extrema não a transformava num simples objeto sexual da qual muitas mulheres no rock eram reduzidas nos anos 80, principalmente nos clipes de rock. Em uma entrevista, Wendy disse que o jeito dela se vingar dessa diminuição às mulheres era justamente não colocá-las em seus clipes como modelos e objetos, pelo contrário, nos vídeos do Plasmatics, Wendy era sempre o destaque lutando, fazendo acrobacias audaciosas e esmagando tudo no seu caminho.
Usava cone bra antes de Madonna. Joan Rivers a chamou de
"Joan Crawford num sutiã de torpedo".
"Joan Crawford num sutiã de torpedo".
Como crítica do consumismo, já naquela época Wendy era adepta do que hoje conhecemos como minimalismo. Segundo uma matéria oitentista à People, ela mal tinha produtos domésticos, nem mesmo telefone. Também não usava vestido e não comprava um novo par de calça havia três anos. "Estou mais interessada em ter um lugar para trabalhar minha voz e corpo do que ter móveis", disse à revista. Apesar da preferência em peças justas e curtas, Wendy dizia gostar de usar o que era confortável. Com influência do punk e do metal, muitas de suas roupas vinham do universo fetichista, amava estampas de animais como onça e zebra, jeans apertado e de cintura baixa, camisetas sem manga mostrando suas tatuagens, uma rebeldia para aqueles tempos, ainda mais vindo de uma mulher! Só não consegui confirmar se as peças de fetiche que usava e as jaquetas eram de couro ou imitação, pois ela era ativista dos animais e não usava maquiagens que faziam testes em bichos.
Os retângulos pretos tapando os seios eram uma forma de provocar a censura, já que Wendy foi presa algumas vezes por 'exposição indecente'. Sempre indo além, em vez das fitas, às vezes usava pasties com spike ou colocava prendedores de roupas nos bicos, ou quando não usava nada, tapava suas partes íntimas com creme de barbear, mas durante o show acabava derretendo, correndo o risco de ir presa por obscenidade.
Em 1981, Wendy foi exatamente presa por obscenidade num show em Milwaukee ao simular masturbação numa marreta. Enquanto era direcionada para a viatura do lado de fora, um policial a assediou sexualmente apalpando suas partes íntimas, o que resultou numa reação de defesa agressiva de Wendy. Nisso, outros policiais chegaram, a jogaram no chão, chutaram seu rosto, quebraram seu nariz e provocaram um corte de doze pontos em sua cabeça. Rod Swenson tentou impedir mas também acabou sendo agredido e Jean Beauvoir, que tocava com a banda na época, sofreu agressões físicas e verbais racistas. O caso repercutiu na imprensa americana, chegaram a ir à Corte e Wendy foi absolvida da acusação. No ano seguinte seria presa novamente pelo mesmo motivo e também absolvida.
Em entrevistas era comum perguntarem à Wendy se ela e a banda provocavam violência pelas atitudes que tinham no palco ao destruir objetos. A cantora respondia questionando que era normal estupro e assassinato no noticiário, mas não era normal quebrar tevês, o que deixava claro como as coisas na sociedade estavam fora de proporção. "Quanto mais você suprime, quanto mais você reprime, tudo o que faz é criar mais violência, no meio desse tédio vem a violência, vem os assassinatos e as reais doenças da sociedade".
Dizem que Wendy não curtiu o filme que atuou em 1986, Reform School Girls.
Particularmente não gostei também.
The Plasmatics durou dez anos e durante esse tempo houve a carreira solo de Wendy. O término ocorreu em 1988, trocando de vários músicos e lançando cinco álbuns: New Hope for the Wretched (1980), Beyond The Valley of 1984 (1981), Metal Priestess (1981), Coup d'Etat (1982) e Maggot: The Record (1987). A banda foi pioneira em misturar punk e metal, o que segundo Rod causou desagrado aos primeiros fãs que eram punks. Maggot foi considerado o primeiro Trash Ópera da história. Nesse período também fez parceria com Gene Simmons e outros integrantes do Kiss para seu primeiro disco solo W.O.W e com Lemmy Kilmister junto com Plasmatics no EP 'Stand By Your Man'.
Lemmy e Wendy |
O final de vida da Wendy não seria nada bom, com o fim da banda ela se recolheu, ficou antissocial e quase não havia notícias dela, a pessoa mais próxima e quem confiava era Rod Swenson. Ela se sentiu perdida sem o Plasmatics porque foi pela banda que conseguiu se encontrar como pessoa. Mudou-se para Storrs, Connecticut em 1991, e dedicou-se a resgatar e cuidar de animais órfãos e feridos no Quiet Corner Wildlife Center. Estava obcecada pela morte tentando suicídio três vezes: uma em 1993, outra em 1997 e a última em 1998. Acabou falecendo com um tiro na cabeça no bosque onde ficava a casa de Rod, sendo o próprio que encontrou seu corpo. O óbito foi no dia 06 de Abril de 1998, tendo apenas 48 anos de idade.
Apesar da imagem agressiva nos palcos, fãs que tiveram oportunidade de conhecê-la disseram que a artista era supersimpática pessoalmente. Para Wendy, o rock era atitude e isso ela tinha muito, tanto que deixou muito homem rockstar no chinelo, diria até que GG Allin! Uma pena ter falecido tão cedo, e assim como vários outros nomes de mulheres, seu legado na história do rock precisa ser mais reconhecido e lembrado. Tá feita a nossa parte!
_______________________
Convite: apoie a campanha de 10 anos de blog!
Acompanhe nossas mídias sociais:
Direitos autorais:
Artigo original do blog Moda de Subculturas, escrito por Sana Mendonça e Lauren Scheffel. É permitido compartilhar a postagem. Ao usar trechos do texto como referência em seus sites ou trabalhos precisa obrigatoriamente linkar o texto do blog como fonte. Não é permitida a reprodução total do conteúdo aqui presente sem autorização prévia. É vedada a cópia da ideia, contexto e formato de artigo. Plágios serão notificados a serem retirados do ar (lei nº 9.610). As fotos pertencem à seus respectivos donos, não fazemos uso comercial das mesmas, porém a seleção e as montagens de imagens foram feitas por nós baseadas no contexto dos textos.
Artigo original do blog Moda de Subculturas, escrito por Sana Mendonça e Lauren Scheffel. É permitido compartilhar a postagem. Ao usar trechos do texto como referência em seus sites ou trabalhos precisa obrigatoriamente linkar o texto do blog como fonte. Não é permitida a reprodução total do conteúdo aqui presente sem autorização prévia. É vedada a cópia da ideia, contexto e formato de artigo. Plágios serão notificados a serem retirados do ar (lei nº 9.610). As fotos pertencem à seus respectivos donos, não fazemos uso comercial das mesmas, porém a seleção e as montagens de imagens foram feitas por nós baseadas no contexto dos textos.