O "estilo" Seapunk tem sido muito anunciado em sites e blogs de moda. Alguns dizem que é ligado com temas do mar, sereias, cabelo rosa pastel... mas será mesmo? Apesar de ter dado as caras em 2011, só recentemente o mainstream brasileiro passou a se interessar pelo fenômeno. Intrigada, fui atrás para saber se o Seapunk é a tal tendência alternativa que nunca existiu.
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Futurebones, Ultrademon e Zombelle |
O início: A gang Seapunk
Em junho de 2011, o produtor musical @LilInternet twittou:
SEAPUNK LEATHER JACKET WITH BARNACLES WHERE THE STUDS SHOULD BE?
algo como "seapunk jaqueta de couro com cracas no lugar dos rebites?"
depois desse tweet, @LilGovernment respondeu à @LilInternet
LET‘S MAKE SANDCRASSLES #SEAPUNK
(não sei traduzir isso, mas pode ser que o "SANDCRASSLES" seja "sand castles". Traduzido então, ficaria "vamos fazer castelos de areia #seapunk".
Essa foi a primeira vez que a hashtag seapunk foi usada. A piada interna envolveu outros amigos de Lil Internet marcados na conversa, em particular os usuários @Ultrademon e @Zombelle - estes dois, considerados os "criadores" do Seapunk enquanto microcultura musical e visual.
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A seta aponta para @Ultrademon e @Zombelle |
Durante a pesquisa para este post,
li dezenas de artigos na web e percebi informações
desencontradas e com a visão que o mainstream faz sobre o tema. Resolvi
então apostar em outra abordagem: escrever sobre o Seapunk na visão de
seus
criadores, no underground. O estilo é americano, de Chicago,
curiosamente uma cidade que não tem mar.
Os criadores do Seapunk
Em seu tumblr, o DJ Ultrademon costumava postar cenas oceânicas misturadas com símbolos ocultistas, yin-yangs e símbolos da paz, assim como computação gráfica...
Imagens Seapunk de computação gráfica do tumblr de Ultrademon
... ele também postava imagens de pessoas com cabelos verdes e roupas cujas estampas remetiam à temas marinhos. Assim, através de seus seguidores, a imagem de um "conceito Seapunk" se espalha pelo tumblr abrindo centenas de possibilidades de interpretações.
Sendo um DJ, ele cria em 2012 a gravadora Coral Records promovendo artistas eletrônicos como Teengirl Fantasy, Jerome LOL, Fire For Effect, Zombelle, Slava, Unicorn Kid e Splash Club 7.
Tendo moda e música unidos, o Seapunk passa a ser considerado uma microcultura ou subcultura, por ter uma identidade musical e visual.
Lil Internet, criador da hashtag, descreve o Seapunk como “Venice Beach Acid Rave 1995” e cita sons do oceano, hip-hop dos anos 90, música eletrônica e dance como elementos fundamentais.
Para o artista Fire For Effect, "A
praia simboliza para mim de onde nós viemos, já que eu penso que
somos mamíferos aquáticos. Nós somos mais parecidos com golfinhos e
baleias do que com macacos".
Ao contrário do que muitos acham, Seapunk não tem envolvimento com RocknRoll nem com Punk, é música eletrônica. Clique [aqui] pra ouvir a música Yr So Wet 3, de Ultrademon e Dj Kiff.
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Shan Beast (@Zombelle) e Albert Redwine (@ultrademon), auto intitulados criadores do Seapunk |
Zombelle, a cantora/rapper de cabelos verdes, é considerada a primeira dama do Seapunk, nome que segundo ela, vem da substituição das letras S-E-A na palavra cyberpunk (não tem tanto a ver com "atitude punk", nem com o "faça você mesmo" ) – como a internet é uma vasto mar de informações, a melhor forma de explicar o estilo é dizer que é uma ideologia focada em positividade e criar seu próprio mundo fantástico através da internet.
A estética
Na foto abaixo, Zombelle ostenta cabelo verde e óculos de lente refletiva. Segundo ela, nunca houve uma nostalgia pela moda noventista - isso veio de interpretações de outras pessoas sobre o estilo, assim como o cabelo cor de rosa, inexistente na ideia original. Gwen Stefani nos anos 90 com cabelo azul não é "a primeira" Seapunk, pois o Seapunk como subcultura só surgiu em 2011. Essa confusão acontece depois que se proliferam as imagens do tumblr de Ultrademon pela web, dando abertura a diversas interpretações sobre o tema, cada uma com seus "achismos".
Abaixo, reparem nas calças de surfista de Ultrademon...
A turma Seapunk criou em 2012 diversas estampas vendidas em parceira com a gravadora. A "verdadeira" moda Seapunk envolve principalmente estampas inspiradas em computação gráfica, temas de praia e mar, símbolos yin-yang, ocultistas, tie dye, óculos de lente refletiva e cabelos verdes ou azuis com roxo (em cores vibrantes e não pastel).
Zombelle e Ultrademon e algumas camisetas.
No Mainstream
Em março de 2012, o jornal New York Times anuncia o Seapunk
como uma tendência de moda. No fim do mesmo ano,
Rihanna se apresenta no SNL em frente a uma tela que mostrava desenhos de computação gráfica. Nesse período também, a cantora Azealia Banks lança um vídeo chamado Atlantis em que aparece
como uma sereia dançando sobre figuras aquáticas e castelos de areia,
fazendo a imagem Seapunk oficialmente mainstream. A partir daí, o estilo
foi apropriado tanto pela moda dominante quanto por stylists de
celebridades.
Sereias não são Seapunk... mas golfinhos são.
Zombelle fala que "As sereias são harpias viciosas que atraem marinheiros para a morte" e afirma que estas não são parte da estética Seapunk original, dizendo que Azealia Banks usou sereias em seu clipe de modo propositalmente equivocado, como uma provocação.
O mainstream resume a imagem
Seapunk focando na cor dos cabelos, como se apenas os fios nas cores verde ou azul já tornassem a pessoa adepta do estilo. Exemplos: Nicki
Minaj, Katy Perry e Lady Gaga usando uma peruca azul neon. Zombelle
complementa: “Tem pessoas que
trabalham com Lady Gaga que estão no meu círculo de amigos” - insinuando que a cantora pode ter se inspirado no corte e cor de seus cabelos.
O salão londrino Bleach London, frequentado por celebridades, também entrou na onda e lançou uma coloração chamada "Seapunk Super Cool Colour" num tom verde claro.
Quando o Seapunk é cooptado pelo Mainstream, Ultrademon e Zombelle postam uma foto com a frase estampada na camiseta: "Misappropriated punks" - uma crítica à apropriação desonesta de uma ideia para se obter lucro.
Reinterpretações da moda Seapunk
Sendo uma estética que teve a imagem propagada no Tumblr e má interpretada pelo mainstream, num dado momento, uma
onda de garotas na faixa dos 20 e poucos anos, denominam seus estilos
como Seapunk e criam releituras do que elas entendiam ser o visual.
Numa busca pela internet, todas as fotos abaixo foram encontradas como #seapunk. Em alguns looks, não são usados todos os elementos que caracterizam o estilo e sim parte deles.
Os dois últimos looks deste quadro, me chamaram a atenção: embora tagueados como tal, não vejo quase nada de Seapunk neles. No look da esquerda, as camisetas com estampas gráficas não possuem temas marinhos e a moça da quarta foto, está mais para uma releitura raver noventista.
Norelle Rheingold ficou conhecida por ter tido uma "fase Seapunk". Dando uma geral nas fotos dela, a mais "fiel" ao estilo é esta primeira imagem, onde usa blusa tie-dye, óculos espelhados e cabelo verde embaixo de um aplique roxo. Já a garota da foto abaixo, apesar de usar uma blusa com símbolo yin-yang, seu look não tem elementos primordiais do estilo.
Para o mainstream, tudo que é azul, verde, holográfico ou tons neon, com referência da moda anos 90 ou mar, tornou-se Seapunk - mas como vimos, não é bem assim, o visual foi bem desvirtuado. A moda dos anos 90 não é fator determinante para definir o estilo, é apenas uma tendência que qualquer um pode fazer uso.
A grande verdade é que cada um passou a interpretar o Seapunk à seu modo, com o que acreditam ser, afastando-o de seu conceito original.
Uma observação mais detalhada revela que desde 2010 o mainstream tentava
empurrar roupas em tons pastel como nova tendência, mas não estava surtindo efeito. Com a deixa do Seapunk, viu-se então uma ótima oportunidade de pegar a ideia do tema marinho e usá-la como trampolim temático para uma nova trend que poderia desencalhar antigos estoques, que acabou por ganhar o nome de "sereismo".
Este é um exemplo de como uma estética de um pequeno grupo de amigos teve uma parcela de sua imagem e significados perdidos entre os compartilhamentos na web, sendo transformado praticamente em outra coisa. Que loucura!
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